A Igreja nos oferece uma série de leituras do capítulo seis do Evangelho de São João, em torno da Multiplicação de Pães e o Discurso de Jesus a respeito do Pão da Vida. Podemos identificar a convergência que desemboca no anúncio da Eucaristia, com as provocantes palavras do Senhor: “Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo” (Jo 6,51). Daqui nasce a oportunidade para refletir sobre a Eucaristia e nossa participação consciente no mistério do Corpo e do Sangue do Senhor.

As narrativas da instituição da Eucaristia se encontram na primeira Carta de São Paulo aos Coríntios (1 Cor 1,23-29) e nos Evangelhos Sinóticos, Mateus (Mt 26,26-29), Marcos (Mc 14,12-22) e Lucas (Lc 22,7-20), enquanto o quarto Evangelho se refere a modo de anúncio no capítulo seis, como acabamos de recordar. Nos Atos dos Apóstolos, as primeiras comunidades eram fiéis à “fração do Pão”, primeiro nome da Celebração Eucarística (At 2,42-47). Eram ainda fiéis às outras características da vida cristã, a saber, a doutrina dos Apóstolos, a Oração e a Comunhão de Bens.

A Celebração Eucarística, especialmente no dia do Senhor, Páscoa Semanal, tornou-se ponto de referência para a vida cristã, modo concreto e privilegiado de santificá-lo, no cumprimento de um dos preceitos da Lei de Deus. A Eucaristia se manifesta assim como o cume de toda a ação da Igreja e a fonte de toda a sua vida. É em primeiro lugar direito de a Comunidade Cristã participar da Ceia do Senhor, tornando-se também dever sagrado, como expressão de fidelidade ao Senhor, que se faz presente no meio de nós. Vale a pena recordar a magnífica Homilia de Bento XVI, em maio de 2005: “Este Congresso Eucarístico quis apresentar o domingo como “Páscoa semanal”, expressão da identidade da comunidade cristã e centro da sua vida e da sua missão. O tema escolhido “Sem o Domingo não podemos viver” leva-nos ao ano 304, quando o imperador Diocleciano proibiu aos cristãos, sob pena de morte, de possuir as Escrituras, de se reunirem ao domingo para celebrar a Eucaristia e de construir lugares para as suas assembleias. Em Abilene, uma pequena localidade na atual Tunísia, quarenta e nove cristãos foram surpreendidos um domingo enquanto, reunidos em casa de Otávio Félix, celebravam a Eucaristia desafiando as proibições imperiais. Foram presos e levados a Cartago para serem interrogados pelo procônsul Anulino. Foi significativa, entre outras, a resposta que um deles deu ao procônsul que lhe perguntava por que motivo violaram a ordem severa do imperador. Respondeu: “Sem o domingo não podemos viver”: isto é, sem nos reunirmos em assembleia ao domingo, para celebrar a Eucaristia não podemos viver. Faltar-nos-iam as forças para enfrentar as dificuldades quotidianas sem sucumbir. Depois de atrozes torturas, os quarenta e nove mártires de Abilene foram mortos. Confirmaram assim, com a efusão do sangue, a sua fé. Morreram, mas venceram: agora, nós os recordamos na glória de Cristo ressuscitado. Sobre a experiência dos mártires de Abilene também nós, cristãos do século XXI, devemos refletir. Também para nós não é fácil viver como cristãos, mesmo se não existem estas proibições do imperador”. Trata-se de uma escolha muitas vezes difícil e ao mesmo tempo realizadora de nossa vida cristã! Sem o domingo, sem a Eucaristia, não podemos viver!

No correr dos séculos, os cristãos aprofundaram o Mistério Eucarístico como Comunhão com Cristo e os irmãos, Renovação do Sacrifício de Morte e Ressurreição do Senhor e Presença real de Jesus Cristo, realidades que nos atraem e nos sustentam para o testemunho a ser oferecido ao mundo.

Como participar de modo consciente, ativo e frutuoso da Eucaristia? Dela nos aproximamos com fé! Não se trata de mera lembrança, mas presença real da entrega do Senhor pela nossa vida e salvação. Não é uma reunião como qualquer outra, mas o acontecimento da Cruz e da Ressurreição do Senhor, Mistério Pascal posto à nossa disposição, para dele colhermos todas as graças de vida e santidade. Preparar-se adequadamente significa viver da graça e na graça de Deus. Como temos a consciência de sermos frágeis e pecadores, sabendo que não merecemos tamanha comunhão com Deus, da qual temos premente necessidade, buscamos a reconciliação com Deus e com os irmãos. O Sacramento da Penitência, oferecido pela Igreja, é o caminho normal a ser buscado para o perdão dos pecados. Além disso, vale recordar e colocar em prática a exigência de reconciliação com os irmãos e irmãs (Cf. Mt 5,20-26). Depois, cada palavra, gesto, movimento, silêncio, tudo o que se realiza na Celebração Eucarística pede inteireza de nossa presença e atenção. Cada parte da Missa, do princípio ao fim, pede consciência e envolvimento.

Quem se aproxima do Mistério Eucarístico o faz porque reconhece o Senhor e a sua presença. Quem comunga, é porque adora! Adorar para comungar, ser capaz de proclamar a realidade de sua presença real. E cada vez que nos aproximamos do Tabernáculo, em nossas igrejas, ali está uma lâmpada a alertar a presença do dono da casa, e podemos repetir: “Graças e louvores sejam dados a todo momento, ao Santíssimo e Digníssimo Sacramento!” Nestes dias recordamos dois grandes santos, cuja doutrina e prática de vida nos remetem ao Sacrário: Santo Afonso Maria de Ligório e São Pedro Julião Eymard. Que eles roguem por nós para que cresça nossa piedade eucarística! Do Sacrário brota o Culto Eucarístico fora da Missa: a Adoração Eucarística, a Visita ao Santíssimo Sacramento e de modo especial a Comunhão levada aos enfermos, além da possibilidade de receber a Eucaristia nas celebrações feitas nas comunidades, presididas pelos Diáconos ou pelos Ministros Extraordinários da Comunhão Eucarística.

Terminada a Missa, começa a nossa missão: ser comunhão, partilha, doação de vida para os outros. Quem comunga na missa há de comungar na vida, não regateando generosidade, espírito de serviço, responsabilidade social, gestos que prolongam a entrega que Jesus fez em nosso benefício e, em nós, a toda a humanidade, Pão vivo para a vida do mundo!