A Sagrada Escritura está repleta de páginas que nos surpreendem pela desproporção entre as forças e os recursos humanos postos à disposição de Deus e frutos decorrentes. As parábolas do Reino, que se referem a sal ou fermento, semente, ovelha, moeda ou filho perdido são belos exemplos. Mas as atitudes de Jesus abrem mais ainda o horizonte, que podemos chamar de exuberância do amor de Deus, sua misericórdia e liberalidade, como a multiplicação de pães. E também o Antigo Testamento oferece episódios que o atestam e anunciam profeticamente. No domingo que estamos para celebrar, o profeta Elias está na casa de uma pobre viúva em Sarepta. Apenas um pouco de azeite e um punhado de farinha, postos à disposição de Deus! Entretanto, tudo é manifestação da salvação que é oferecida, e seu ponto de realização é a encarnação do Verbo de Deus, vindo ao mundo para salvá-lo e redimi-lo, no seu mistério pascal de abaixamento e de elevação, para que o pequeno se faça grande, na graça que vem do alto. E Jesus está no templo (Mc 12, 41-44), a observar pessoas de todas as situações sociais que fazem suas oferendas. Uma viúva pobre deu mais do que todos, pois ofereceu tudo o que possuía. Seu óbolo, saberemos um dia, diante de Deus, terá mudado muito o mundo.
Neste episódio, o Senhor oferece um ensinamento que ressalta a importância do que aparentemente é insignificante. Diante de Deus, o valor das ações consiste mais na retidão das intenções e na generosidade de espírito do que na quantidade que se dá. O desprendimento efetivo dos bens supõe uma privação. Um desprendimento que não custa é pouco real. E o estilo de vida cristão supõe uma mudança de atitude diante dos bens materiais. Estes hão de ser usados não como um fim em si mesmos, mas como meio para servir a Deus, à nossa família e ao próximo. O cristão não vive para ter cada dia mais!
A matemática de Deus é diferente dos critérios humanos de administração! Todos os cristãos, quando se lançam na maravilhosa aventura da confiança na Providência divina, podem experimentar os caminhos que o Senhor lhes indica para a contínua descoberta da multiplicação de dons e de bens.
O tempo que vivemos, com a propalada crise econômica e social, provoca as pessoas e as instituições. O dinheiro, ficou curto, o emprego sumiu, as dificuldades aumentaram. É o que ouvimos continuamente. Entretanto, onde quer que a generosidade cresça, também os frutos aparecem. Só que as pessoas precisam ter coragem para se lançarem, num gesto de confiança. Podemos começar com uma boa revisão a respeito do que guardamos de supérfluo, inclusive as pequenas coisas guardadas nas gavetas dos armários e dos corações, com a desculpa de que um dia podem servir! Há uma reserva imensa de bens a serem partilhados, se nossos corações se abrirem. Depois, vale identificar o uso dos bens e do tempo, pensando nos campos de serviço e participação social e religiosa que nos são abertos. Uma pessoa que só se interessa pelos seus próprios bens ou crescimento, que não abre sua porta para as necessidades e apelos da comunidade empobrece seu viver e se faz infeliz! Quanto tempo cada um de nós dedica ao serviço comunitário, ao voluntariado, às obras sociais de nossa Igreja?
E os horizontes podem ser ampliados nas dimensões da sociedade, para chegarem até os planos de governo, já que estamos em tempo de mudança nos diversos níveis de administração. Seria sonhar demais pensar que os mais pobres fossem incluídos em primeiro lugar? Nossas periferias, nossas baixadas, a imensa necessidade de atenção aos que estão à margem dos benefícios sociais estão gritando socorro!
Mas tudo isso só pode acontecer quando os corações se transformarem. Qualquer mudança, ou vem de dentro ou não se sustenta! Quando Jesus se acha em Jerusalém, seu desejo é suscitar a conversão profunda e verdadeira. E aqui a Palavra que ouvimos na Igreja precisa encontrar eco lá dentro, de forma a que seus discípulos de todos os tempos venham a testemunhar formas diferentes de vida.
Durante o mês de novembro, muitas Comunidades se dedicam a conscientização a respeito do Dízimo, uma forma significativa de comunhão de bens. É muito feliz a expressão “devolver o dízimo”, pois ajuda a tomar consciência de que ele não é contribuição de sócios ou esmola, mas gratidão que se expressa diante dos imensos dons que nos são oferecidos pelo Senhor. Diante dele, já somos devedores! E o dízimo expressa a participação efetiva na Comunidade cristã, devendo ser “tirado” em primeiro lugar, antes de qualquer outra despesa. E é significativo o quanto a resposta de Deus chega na vida das pessoas, pois o que parece pouco se multiplica.
“Pois assim fala o Senhor, Deus de Israel: ‘A vasilha de farinha não acabará e a jarra de azeite não diminuirá, até ao dia em que o Senhor enviar a chuva sobre a face da terra’”. A mulher foi e fez como Elias lhe tinha ordenado. E comeram, ele, ela e sua casa, durante muito tempo. A farinha da vasilha não acabou, nem diminuiu o óleo da jarra, conforme o que o Senhor tinha dito por meio de Elias” (1 Rs 17,14-16).