“Ghidini! O conheci e admirei. Simples, humilde, aliás sério, observante no horário, de bom exemplo a todos. Parece-me que quando se é noviço se é sempre fervoroso, mas o calor do noviço Ghidini devia ser alimentado por um combustível de boa qualidade: mantinha a temperatura alta sem consumar-se. Pelo contrário: aumentava sempre mais” (D. Elizeu Coroli – RAMOS, p. 45)
Serafim Maria Ghidini nasceu em 10 de janeiro de 1902, numa família da vila de Cavallara (Mântua), município de Viadana, no norte da Itália. É o primogénito dos seis filhos do Senhor Luiz e da Dona Virgínia. Na terra mantuana, a mãe e a avó ficavam responsáveis por ele, enquanto o pai trabalhava na plantação. O avô dele, um italiano religioso tradicional, transmitiu-lhe a educação religiosa.
Há poucos dados sobre sua juventude, mas os relatos disponíveis são edificantes e relevantes para quem quer compreender melhor esse amigo de Deus. Sua personalidade é um exemplo para todos os jovens, sendo uma pessoa verdadeira, com uma história que mostra que é possível superar qualquer dificuldade. Ele persistiu valorosamente ao responder ao chamado que sentia e entrou no seminário, apesar de contrariar seus genitores em relação à sua vocação, sobretudo o seu pai, que tinha uma atração pelos princípios socialistas.
O progenitor de Serafim enviava cartas ao seu filho e era de espantar cada uma delas! Quando o Sr. Luiz chegou a Cremona, ficou de olho nas atividades do filho e prometeu que, se o visse indo e vindo da Igreja de São Lucas, o castigaria. Além disso, determinou que o rapaz retornasse ao trabalho, pois havia conseguido a vaga de emprego justamente para que Serafim ajudasse nas despesas familiares. O jovem cumpriu o que foi pedido, mas continuou seguindo sua vida de seminarista. No dia em que o pai voltou para sua terra natal, teve um encontro com Minuti, que era patrão de Serafim e presidente da Conferência Vicentina do Círculo Juvenil Zaccaria. Minuti apresentou o jovem aos Barnabitas, depois de uma conversa, considerando que o pai de Serafim havia mudado de opinião.
O patrão, bastante apegado ao jovem funcionário, algumas vezes quis dar-lhe parte de seu comércio, mas ouviu dele “amar muito mais tornar-se religioso do que fazer fortuna”. O pai, por sua vez, rendeu-se ao desejo de Serafim, mas despediu-se sem dizer uma só palavra. Contudo, naquela atitude rude, o pai demonstrou carinho. Vale relembrar que, após o falecimento do filho, o Sr. Luiz, que já era adepto à fé católica, testemunhou: “O meu Serafim conduziu uma vida santa desde a infância. No pouco em que viveu, em qualquer lugar onde ele esteve, todos podem testemunhar que era um modelo de juventude: um verdadeiro São Luiz Gonzaga” (RAMOS, 1989, p. 16).
Após vencer as últimas resistências, Serafim finalmente conseguiu entrar nos Barnabitas no dia 5 de julho de 1919. Ainda que tenha enfrentado diversas dificuldades durante a vida, nunca deixou de rezar, fazer jejuns e caridades, assim, sempre cumpriu seus serviços religiosos. Durante o seu período de formação, demonstrava a convicção pelo que tanto desejava e se empenhava para atingir o objetivo. Apesar de ter diversas qualidades, não era bom nos estudos, mas se dedicava bastante para se aprimorar. Dado que sua memória era lenta, às vezes sua capacidade de abstração não era tão boa quanto a de seus colegas, mas isso nunca o fez se sentir recolhido ou humilhado.
Uma vocação madura não é abalada por qualquer obstáculo, mesmo que seus colegas ficassem tristes quando ele não atingia o nível da turma. No entanto, isso não decorria da ausência de dedicação, uma vez que Serafim se empenhava em todos os serviços comunitários e pessoais.
Quando era o seu turno na limpeza dos sanitários e dos lavatórios, com quanta dedicação não o fazia, a fim de que tudo fosse bem limpo e torneiras brilhantes! E pensar que então não se usavam os detergentes como hoje, mas se limpava tudo a força de braço e com cinza. Nem mesmo o frio e o arroxeado nas mãos o impediam. (RAMOS, 1989, p. 31).
O grande esforço do rapaz, não demonstrava vontade de se destacar entre muitos, apenas queria atingir o seu objetivo. Pe. Mazzucchelli testemunhava: “Nele, a regra teve um exemplar vivente. Nada de querer aparecer, mas somente um grande fervor, uma extraordinária exatidão, um ardente desejo de logo crescer na perfeição. Parecia saber que o seu caminho seria curto”. (RAMOS, 1989, p. 30).
Serafim M. Guidini chegou ao noviciado em 22 de julho, carregou a cruz em 26 de julho (costume dos jovens aspirantes quando são admitidos à vida barnabítica) e, diferentemente do processo daquela época para os dias atuais, recebeu o hábito em 31 de outubro, iniciando o ano canônico do noviciado.
O noviciado foi bem pesado, ao contrário do que aconteceu nos anos anteriores. Para quem estava tomando aquilo a sério, era preciso fazer penitências constantes. Não havia tempo para descanso, a concentração era exclusivamente em um lugar, a programação e a lista de regras eram tão exigentes que Serafim duvidou se daria conta, como relata o seu padre mestre:
Lembro muito bem que ele era de um temperamento sobretudo nervoso e explosivo. Porém, com esforço contínuo, obteve sobre si um domínio invejável de modo a não deixar transparecer a luta que por vezes travava em seu interior, frente às dificuldades que se lhe apresentavam. (RAMOS, 1989, p. 30).
Em prova de seu aperfeiçoamento, Pe. Tiago Calsia, um dos seus colegas de turma do seminário, relembra que Ghidini tentou viver de acordo com as regras, sem seguir o método das regras para se tornar santo, em um horário pré-estabelecido. O companheiro de seminário afirma que a santidade é algo mais do que a anarquia, a desordem, o capricho, o arbítrio. Mas “a santidade é espontânea, é liberdade na lei”. Não é mecanismo, mas é amor; não é escravidão, mas um lançar-se espontâneo” (RAMOS, 1989, p. 55). O que chocou foi que, ainda que enfraquecido e doente, Ghidini ainda conseguia ficar de pé, apesar de muito sofrido e com o rosto irreconhecível por conta da dor.
Certa manhã de inverno, viu-o carregando um grande balde de água quente pelas escadas internas do noviciado. Subia os degraus com cautela, um por um, apesar de encontrar dificuldade. Sempre que não aguentava mais, parava para descansar um pouco, mas logo pegava o balde e seguia, subindo mais um degrau e, então, descansava outra vez, pois, a vontade de servir o semelhante substituía as forças físicas. Ao chegar ao corredor, parou e retomou o caminho, até chegar no quarto de um dos confrades. Batendo na porta, entregou-lhe o balde, como se nada tivesse acontecido.
A comunidade de Monza aprovou Serafim Ghidini para a profissão religiosa. Na manhã do dia 1 de novembro de 1923, um pouco fragilizado, mas acompanhado pelos seus colegas, Ghidini proferiu os votos de pobreza, obediência e castidade perante a Deus. “A profissão religiosa, que para outros é ponto de partida, para ele havia de ser ponto de chegada.” (RAMOS, 1989, p. 48).
Dado que a doença se agravara, Serafim sabia que seu tempo estava se esgotando. Passou o terço ao redor do pescoço, pegou os livros de orações e as imagens dos santos. Não estava com pressa de chegar ou de voltar. Quando o dia se aproximou, pediu ao padre Favero que concedesse a extrema-unção. O padre Beati havia feito uma proposta para fazer a profissão solene. Serafim pareceu reviver e recitaram juntos. Assim, quando o padre recitava a fórmula da profissão solene próximo ao jovem, Serafim murmurava mexendo os lábios. Quando finalizaram, demonstrou toda a sua felicidade.
Dessa forma, ao raiar do dia, Serafim não estava mais vivo. O médico confirmou que o jovem barnabita havia morrido de tuberculose. Em 13 de janeiro de 1924, Serafim foi ao encontro de Deus, como anjo, para aqueles que tanto o admiravam.
No ano passado, com a bênção de Deus, tive a chance de visitar o túmulo de Ghidini, na Igreja de São Lucas, terra do nosso Pai Fundador, durante o giro zaccariano. Aquela experiência maravilhosa que vivi junto aos meus companheiros de jornada foi indescritível, sabendo que estava tão perto dos restos mortais de um jovem que tanto admirei na minha formação barnabítica. Deixei minha oração, tanto no coração quanto no papel, para que um milagre ocorresse a um casal de paroquianos que mora em São Paulo e deseja ter um filho.
Serafim, amigo de Deus, interceda por nós. Amém!